terça-feira, 10 de setembro de 2013

Timing.


Um sorriso se destacou entre aquelas luzes coloridas e aquela música sem sentido. Ele levantou a garrafa de cerveja como um cumprimento e sorri de volta, sem graça, fitando meus pés logo em seguida... Ele tinha esse efeito sobre mim. Ele deixou algum dinheiro no bar e foi andando na minha direção, meus pés dela saíram do chão quando os braços fortes e tatuados dele me envolveram, me apertaram.
- Quanto tempo, pequena. - ele sussurrou no meu ouvido causando arrepio instantâneo em lugares que eu nem lembrava que arrepiavam. Eu apertei seus ombros o mais forte que pude e lhe dei um beijo na bochecha. Sussurrei um "oi" meio sem jeito, meio ou cheio de saudades. Meus pés voltaram ao chão... Mais ou menos. Eu ajeitei meu cabelo, numa tentativa de parecer casual. Ele sorriu. Colocou uma mecha do meu cabelo pra trás da minha orelha e olhou pra minha alma, me senti nua ali na frente daqueles olhos que já me conheciam tão bem, mas que ao mesmo tempo pareciam tão estranhos. 
- Quanto tempo. - falei mais pra mim que pra ele. Ele gritou perguntando o que eu tinha falado, a música estava mais alta do que antes ou eu apenas tinha voltado a escutá-la. Balancei a cabeça em negativo e ele riu. 
- Vamos pra outro lugar? - ele perguntou no meu ouvido, dessa vez sem sussurrar, o que causou um certo incômodo. Olhei desconfiada pra ele. - Pra gente conversar, mocinha. - Ele brincou e passou o dedo na linha do meu maxilar e depois apertou meu nariz. Ele sempre fazia isso. Fiz que sim com a cabeça e ele pegou minha mão e o choque se espalhou pelo meu corpo. Porém, nada de dedos entrelaçados. Não sei se fiquei mais aliviada ou decepcionada. Ele pagou o que consumimos e me levou pro restaurante na rua de baixo da boate. Era uma pizzaria qualquer que ficava aberta 24/7 e tinha atendentes nada simpáticos. Não trocamos uma palavra até sentarmos de frente um para o outro, naquela cadeira gordurenta, éramos apenas nós dois e os antipáticos. 
- Caraca, que saudade. - ele soltou meio do nada, me pegando de surpresa enquanto respondia uma mensagem de uma amiga. Guardei o celular e vi seus olhos brilhando do jeito que eu sempre gostei e sempre foi um brilho só meu, só pra mim.
- Quase um ano... - falei meio reflexiva, ele fez uma cara triste. Eu fiz biquinho e ele riu. Pulou para a cadeira ao meu lado e me abraçou. Ficamos sem falar por alguns segundos, meus olhos encheram de lágrimas. Soltei-o antes que as lágrimas fugissem. - É, eu senti sua falta. - confessei. Ele olhou minha alma de novo e me deu um beijo na ponta do nariz. Continuou com um braço em volta do meu ombro e a pizza chegou. Frango. A favorita dele. Nunca entendi, mas aprendi a gostar. 
- Nunca entendi o motivo de você ter ido embora. - ele falou olhando pro teto depois de quase engolir a pizza sozinho. Eu engoli em seco e fechei os olhos. Eu que tinha ido embora, mas eu precisava ir.
- Não faz isso. - implorei. Ele mordeu o lábio inferior e sacudiu a cabeça. Eu sabia que ele não ia desistir. Tinha adiado aquela conversa, mas não ia passar daquela noite. - Eu tive que vir pra cá! Eu tinha passado na faculdade e precisava vir. Era meu sonho. - cuspi as palavras tão rápido que não sei como ele entendeu, mas ele sempre me entendia. 
- Eu sei disso. - ele sussurrou. - Mas por que você deixou a gente? Você sabia que eu vinha pra cá depois. 
- Eu precisava vir sozinha.
- Você não me queria mais.
- Sempre te quis, nunca deixei de te querer por um segundo nesses 11 meses. Mas eu precisava viver um pouco sozinha. Nossos dois anos juntos foram intensos e você sabe que eu me apavoro com essas coisas e... A gente ia ficar longe por muito tempo, eu tinha medo de não dar certo essa história de distância pra gente. Desculpa, tá? Foi puro medo de fazer alguma coisa errada e de te perder de vez. - falei segurando as lágrimas que estavam presas na garganta. Ele fechou os olhos e sorriu um pouco.
- Eu entendo. Você me deixou pra viver um pouco a vida solteira e curtir o primeiro ano da faculdade.
- NÃO! - quase gritei e ele pulou com o susto. - Não foi isso, Alex, não foi. Eu tinha medo de fazer algo de errado e te magoar, nunca fui boa em relacionamentos, imagina em um a distância! 
- Você é ótima com relacionamentos. Pelo menos comigo.
- Eu sou a minha melhor versão contigo. - disse baixinho, mais pra mim que pra ele. Ele sorriu, dessa vez de verdade. - Desculpa, Al. De verdade, foi medo de errar. Não to te pedindo pra voltar, nem sabia que você já tava aqui, na verdade. Mas eu ainda te amo e tive que me segurar todos os dias pra não te ligar, não voltar pra aquela cidadezinha-lixo. Nem por um segundo eu deixei de te amar. - soltei olhando nos seus olhos e algumas lágrimas escaparam dos meus olhos e uma escapou dos dele. Ele olhou pro chão e pro teto.
- Sabe qual o seu problema? Você não confia em você. Porra, Gi. Eu confio em você. Sempre confiei e vou sempre confiar. Eu acredito em você e queria que você fizesse o mesmo. - ele falou segurando meu rosto. Balancei a cabeça com um sorriso aliviado.
- Eu precisava desse ano pra mim, pra aprender a fazer essas coisas por mim e comigo, sozinha. - disse. Ele abriu um sorriso largo. - E eu aprendi, eu confio em mim agora, eu sei que eu sou capaz de tudo que você sempre disse que eu era. - Ele me deu um beijo. Meu coração quase parou.
- Volta pra mim? - ele sussurrou com as nossas testas coladas uma na outra.
- Eu não sou mais aquela menininha assustada e desconfiada, você ainda me quer? - eu brinquei.
- Eu nunca acreditei naquela sua versão. - ele disse antes de me beijar mais uma vez. Pagamos a conta, pegamos um táxi e paramos no apartamento dele. Elevador. Mãos. Boca. Porra, cadê a chave? Desculpa a bagunça. Uhum. Beijo. Pescoço. Arrepio. Amor. Suor. Saudade. Cansaço. Te amo. Eu amo você e morri de saudades. Vou tomar um banho. Ok. Ele saiu do banheiro com a toalha enrolada na cintura e um sorriso no rosto. Eu vestia a minha-blusa-dele e enquanto prendia o cabelo num coque ele sentou ao meu lado e beijou meu pescoço. Eu sorri.
- Achei que a gente só ia conversar. - brinquei. Ele riu e me puxou pra si.
- Dorme aqui hoje comigo. - ele pediu com seu jeito de menino abandonado e eu concordei. Não demorou muito pra eu ter uma gaveta com as minhas coisas, uma parte no armário, uma chave, um anel, um marido.

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Um errado certo.



Só mais essa noite, eu disse pra mim mesma enquanto seu peito subia e descia num ritmo tranquilo que chegava a ser irônico comparado com a velocidade que os pensamentos percorriam minha cabeça. Eu já sentia o aperto da manhã seguinte, sufocando aquela confissão que tentava pular pra fora. Pensei em evitar o inevitável e sair escondida, mas eu só queria ficar ali, deitada no seu peito, sentindo o sobe-desce, tentando copiar o ritmo da sua respiração, mas meu coração já gritava. Gritava para eu ficar. Mas eu tinha tomado uma decisão, você não sabia, mas quando o sol aparecesse eu ia desaparecer, só queria te dar um último beijo. Não te contei, nem pretendia contar. Espero que você entenda depois da segunda ou terceira semana. Espero que você não tente me ligar, de verdade. Espero que você leia nos meus olhos quando eu me despedir amanhã, veja neles meu pedido de desculpas junto com o meu adeus.

Eu me viro pro outro lado, me encolho como um feto, o aperto é enorme, tudo queima dentro de mim, tenho vontade de correr pro banheiro e colocar toda essa dor pra fora. Mas você ia acordar, ia cuidar de mim e talvez fizesse eu mudar de ideia, sem nem saber de nada. Talvez eu devesse ir embora agora, não sei se consigo me despedir dos seus olhos, do seu sorriso-de-bom-dia-flor. Eu me levanto devagar, coloco meu jeans e fico com a sua blusa, você sempre disse que eu ficava bem com ela. Arrumo minhas coisas, rabisco algumas coisas num papel que se misturam com lágrimas e suor das minhas mãos. Largo aquele papel molhado do seu lado e espero que você entenda os meus motivos e a minha letra. Fecho a porta atrás de mim e jogo a minha cópia da chave por debaixo da porta. O aperto e a dor escapam pelos meus olhos e os óculos escuros mais um sorriso ensaiado ajudam a não preocupar o porteiro. São cinco da manhã e minha casa nunca pareceu tão longe da sua. Me jogo na minha cama, acho que nem tranquei a porta, choro todas as dúvidas e me livro de toda a dor ajoelhada no banheiro, encosto a cabeça no azulejo frio e finalmente adormeço. Lá pelas oito acordo com a nossa música berrando no meu celular. Ignorar. Silencioso. Entro no banho. Tento tirar a dor com sabão, sem sucesso. Ainda enrolada na toalha vejo meu celular. Quinze chamadas perdidas. Cinco mensagens. "Flor, que porra é essa?". "Flor, pelo amor de Deus, fala que é brincadeira.". "Ei... Já deu. Que houve? Volta pra cá. Conversa comigo.". "Caralho! Me atende!". "Eu to indo prai.". Meu sangue gelou. Eu conseguia ignorar suas chamadas, mas não sua voz do lado de fora da minha porta e eu nem tinha trancado. Corri para a porta, meu cabelo molhou o quarto inteiro. Você já tava sentado no sofá. Seus olhos mais vermelhos que os meus, sua regata colada no corpo de tanto suor. Você pediu pra eu te explicar, abriu a carta e a leu pra mim.

"Lindo, acho que a gente já se envolveu demais.", você engoliu o choro e continuou: "Desde o começo te falei que a gente não deveria se envolver tanto, sempre estrago as coisas e tenho medo de estragar você. Eu sou tipo uma granada, chego meio devagar, mas pode ter certeza que eu vou machucar e quebrar tudo que estiver a minha volta e lindo, eu não quero te magoar, nunca. Então, acho melhor eu ir embora agora, antes que dê tudo errado, quero que você lembre da "Flor" que existe na sua cabeça, apesar de eu sempre ter achado a sua versão de mim completamente errada e exagerada.", você revirou os olhos nessa hora, olhou pra mim e eu fitava o chão controlando as lágrimas o máximo que pudia. "Eu não sou tudo isso, mas gosto do jeito que você me vê e não quero estragar essa versão linda que você criou. Por isso que eu vou sumir, pra eu não te estragar e não me estragar pra você. Eu te amo.", você soltou o choro junto com uma risada e falou que eu era ridícula, do jeito brincalhão de sempre. Cai no chão, minhas pernas já não me sustentavam. Você se ajoelhou na minha frente e me abraçou.

- Flor, essa foi a primeira vez que você disse que me amava. Na porra de uma carta que era pra se despedir de mim. Você sabe o quanto isso é contraditório e doente? Eu te amo, flor. Mas não é por isso que eu quero te deixar, eu sou normal, flor, eu te amo e quero ficar contigo. Sabe o quanto que isso não faz sentido? Você me ama e não quer ficar comigo! Presta atenção, doidinha. Eu não me importo com essa sua habilidade de magoar as pessoas, eu não me importo com os outros casos, eu não me importo com o quanto você pode ter sido uma filha da puta até três meses atrás. Não me importo. Eu quero ficar com você. Flor. Eu sei que você quer ficar comigo. Isso que você fez, sinceramente, só mostra o quanto você mudou. Você foi capaz de me deixar na tentativa de me fazer feliz, mas eu não vou ficar feliz sem você. Eu também já errei muito nessa vida e não é por isso que eu vou te deixar. Vou ser egoísta, vou te querer só pra mim. Então, por favor, para de ser essa pessoa maravilhosa e seja egoísta junto comigo. Fica comigo. Volta lá pro meu-seu-nosso apartamento. Deita naquela porra de cama e dorme comigo. - Você levantou meu rosto e meus olhos quase estouravam de tantas lágrimas presas ali - Se solta, flor. Se permite. - uma foi escapando, seguida de outra e sem nenhum de esforço elas rolaram livres pelo meu rosto. Você colocou meu cabelo pra trás da minha orelha e me beijou.

Você me pegou no colo e me colocou na cama. Depois de algumas horas no meu apartamento, você mandou eu arrumar minha mala e ir passar a semana com você. Eu sabia que seus olhos não iam permitir que eu negasse. Coloquei um vestido e enfiei algumas roupas e outras coisas na mala. Você sorriu e eu sorri de volta, derrotada, já entregue. Talvez aquilo fosse um erro, talvez daqui alguns meses eu estivesse no meu apartamento sozinha, chorando por ter magoado mais uma pessoa ou talvez eu que estivesse magoada. Nós dois éramos errados da maneira mais óbvia que se pode ser. Mas eram esses erros que nos uniam, eram os nossos passados errados que nos faziam querer um futuro nosso e certo. É, talvez fosse um erro eu pendurar as minhas roupas no seu armário, talvez vender meu apartamento e me mudar pro seu seja um erro. Mas de todos os meu erros, tenho certeza que você foi, é e vai ser o melhor.